Entre os sentidos menos usuais desse verbo temos: conter, incluir, compreender, guardar, recolher e resumir. São outras qualidades possíveis contidas nessa palavra.
Na tentativa de lidar com o sofrimento, as palavras são ferramentas essenciais. Nas conversas e no convívio com pessoas que passaram por situações parecidas, no encontro com gente que não se conhecia e agora divide lembranças, no desabafo daquilo que não se suporta mais. Por vezes, mesmo na ausência de palavras curamos aos poucos as nossas marcas e feridas.
O propósito de um edifício como o Memorial das Vítimas da Kiss deveria ser trazer à consciência motivos que nos façam seguir adiante. Trata-se de um exercício de construir espaços coletivamente para resignificar a morte como uma chance de ver novos sentidos para a vida. A busca de novas palavras para descrever o presente como uma possibilidade de ver o mundo e as pessoas de novas maneiras.
A tragédia de Santa Maria não se apaga facilmente. Ela está desenhada na memória de muitas pessoas. Ela faz parte da história daqueles que tentam, da melhor forma possível, seguir adiante. Cada um dá um sentido particular ao ocorrido e é impossível entender completamente a dor do outro, o luto, a falta que se sente de alguém.
Uma pergunta, no entanto, foi colocada nos últimos meses: qual desenho a arquitetura poderia imaginar para um acontecimento assim?
Busca-se o desenho para um edifício e um espaço livre que possam trazer significado a um local marcado pela tragédia.
Mas qual intenção orientaria um projeto assim? Qual o sentido de um espaço nessas circunstâncias?
Da mesma forma que a palavra encerrar tem várias interpretações, a morte também pode assumir diversos sentidos que não sejam somente o do fim da vida.
Tendo em conta essas intenções, a presente proposta sugere a edificação de dois espaços principais:
• Um percurso cuja atmosfera é de solenidade e de reflexão. Espaço para pensar no tempo que temos e na fragilidade do ser humano. Para pensar a vida e a morte buscando entender melhor a nós mesmos. Nas paredes desse trecho serão grafados os nomes das 242 vítimas.
Esse percurso encerra então um vazio, compreendendo o segundo espaço:
• Um pátio que contém e protege, espaço de contemplação da vida. Uma janela para o céu, um espaço para transitar da sombra à luz. Lugar para recordar o ocorrido, para não se apagar, para estar presente e para iluminar.
Nessa resignificação do sentido da tragédia está também a ressignificação do lugar. Lugar onde a vida se encerra sem significar o término. Local onde a vida e a morte se compreendem, se guardam e se recolhem. Uma arquitetura que nasce das pessoas, dos seus encontros, das suas palavras e, por que não, do seu silêncio.
Segurança e acessibilidade
A materialidade adotada no edifício, além das questões sensoriais, responde às necessidades de segurança, principalmente em virtude da sensibilização das pessoas com relação à tragédia. Grande parte dos materiais de construção é incombustível ou não propagam chama. Além disso, o edifício é aberto, ventilado e tem rotas de saída alternativas diretamente para a rua.
Para garantir a acessibilidade foi respeitada a norma NBR-9050. Nos trechos em que há transição de nível através de escadas, também há instalação de plataforma elevatória. O piso do percurso principal do memorial é formado por uma inclinação inferior a 5%. Além de ser uma inclinação bastante suave, permitindo o deslocamento confortável, por norma não é considerada de fato uma rampa.
O PROJETO
A EQUIPE
Autores
Emerson Vidigal
Eron Costin
Fabio Henrique Faria
João Gabriel Rosa
Martin Kaufer Goic
Daniela Moro
Gabriel Tomich
Matheus Fernandes
FICHA TÉCNICA
- Área Construída: 758,40 m2
- Espaços livres (paisagismo): 307,99 m2